sábado, 31 de março de 2012

intoxicado de sentir

O isqueiro acende o cigarro, que é tragado e repousado sobre um cinzeiro improvisado em uma saboneteira. Um copo com um líquido escuro é derramado em sua boca, seguido de uma tosse áspera. A mão treme e segura a caneta, mergulhando a ponta em um tinteiro. Uma lágrima cai sobre o papel estendido na mesa, e outra tragada no cigarro a segue. Soa um instrumento fortemente soprado, o que parece remeter a algo antigo e rústico. Mas não há mais ninguém ali, apenas o disco tocando, a fumaça dançante e o café amargo no copo opaco.

Ele percorre o indicador sobre a pequena mancha da lágrima sobre a folha e risca uma frase com o nanquim: "Intoxicado de tanto sentir".

they might need rain

Os mortos não precisam comer ou beber. Também não precisam de perfume ou de algum traje que os aqueça. Nem de cigarros ou de café, suponho.

Mas devem precisar da chuva.